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Jaime Fernandes

Portugal, 1900-1969
Diagnosticado com esquizofrenia em 1938 foi internado por mais de três décadas no Hospital Miguel Bombarda (Lisboa), onde viria a morrer em 1969. Jaime Fernandes começou a desenhar inesperadamente aos 66 anos, quatro anos antes da sua morte, de acordo com testemunhos e referências feitas aos desenhos nos registos clínicos do hospital e nas cartas que escrevia à mulher. A totalidade da sua obra conhecida é composta por desenhos, não datados, sobretudo feitos com esferográficas coloridas sobre diversos tipos de papel, onde um reduzido formulário de figuras, sobretudo animais imaginários, figuras humanas ou antropomórficas surge e ressurge em inúmeras variações, sempre desenhados numa densa trama de linhas.

Anna Zemánková

República Checa, 1908 – 1986

Desde cedo revelou um apreço especial pelo desenho, todavia, por imposição familiar, seguiu a carreira de técnica dentária. Em 1933, casou com um alto funcionário e passou a dedicar-se exclusivamente à casa e aos três filhos. A família mudou-se para Praga no fim da Segunda Grande Guerra e, em 1950, Ana sofreu uma grande depressão agravada pela posterior amputação de ambas as pernas. Zemánková iniciou a prática diária do desenho quando tinha mais de cinquenta anos: manifestações espontâneas de inspiração vegetalista que, segundo a própria, são inspirados por forças magnéticas que pressente, entre as 4 e as 7 horas da madrugada, totalmente imprevisíveis no resultado final. Estas criações, de pormenores surpreendentes, detentoras de um ritmo característico entre espirais, arabescos e formas geométricas, fazem de Zemánková uma figura de destaque no panorama da arte bruta.

Aloïse Corbaz

Suíça, 1886 – 1964
A técnica artística de Aloïse Corbaz está intimamente ligada à sua doença – esquizofrenia – e ao seu internamento numa ala psiquiátrica durante quarenta e seis anos. Utilizava materiais que encontrava em latas de lixo. Estes materiais eram achatados, alisados e, todos juntos, remendados, usando algodão branco e fio vermelho. As folhas de papel cosidas juntas permitiram-lhe criar desenhos muito grandes, que Corbaz manteve em rolos. O mundo que criou é povoado por figuras humanas, animais, flores e frutos em encenações teatrais: alguns dos seus temas imitam gestos e poses inspirados em revistas ilustradas ou adotam os atributos e posturas retiradas dos atores do teatro ritual ou da ópera. Teatro, ópera e casais amorosos enfeitam esta cosmogonia, que desenvolveu formas eróticas poderosas.

Biografia adaptada de “AWARE: Archives of Women Artists” de Chaterine Gonnard

Henry Darger

EUA, 1892-1973

Henry Darger viveu num orfanato e mais tarde foi admitido num asilo para crianças com debilidades psíquicas. Trabalhou como porteiro e canalizador num hospital católico, onde permaneceu até à reforma. Em 1963, Kiyoko e Nathan Lerner, seus senhorios, descobriram a autobiografia do artista que continha mais de duas mil páginas, bem como a sua obra ficcional inspirada nas narrativas da Guerra Civil Americana e outros grandes textos de batalha e aventura, In the Realms of the Unreal. Darger incorporou eventos e personagens da sua própria vida nas suas ficções. O trabalho foi acompanhado por várias centenas de ilustrações em grande escala. Darger usou papel de decalque, aguarelas e grafite para executar os seus desenhos. Consistiam em imagens da cultura popular, reproduções de cenas de batalha e ilustrações.

Guo Fengyi

China, 1942-2010

Nascida em 1942 em Xi’an começou a fazer arte no final dos seus quarenta anos, depois de uma artrite debilitante a ter forçado à reforma antecipada de um emprego numa fábrica de fertilizantes químicos. Para aliviar a sua dor crónica, dedicou-se ao qigong – uma antiga técnica chinesa de bem-estar e de recuperação que combina movimentos coordenados, respiração e meditação. Produzindo um espantoso repertório de trabalho nas últimas duas décadas da sua vida, Fengyi criou mais de 500 desenhos complexos a tinta, sobre temas que vão desde a cosmologia e mitologia chinesa, até à medicina e filosofia tradicionais chinesas. Muitos dos primeiros desenhos de Guo Fengyi – incluindo o Diagrama do Sistema Nervoso Humano e O Diagrama do Meridiano do Fígado – mapeiam cuidadosamente os sistemas anatómicos que a artista intuiu, em vez de os ver realmente.

Albino Braz

Brasil, 1893-1950

O percurso que antecedeu o internamento de Albino Braz no hospital psiquiátrico de Juquéri, em São Paulo, especializado no tratamento de esquizofrenia, é pouco conhecido, sabendo-se, apenas que Braz terá origens italianas. O contacto com o desenho ocorreu após a sua hospitalização.
A sua obra é constituída, maioritariamente, por desenhos executados a grafite ou lápis de cor sobre papel onde prevalecem cenários nos quais convivem figuras masculinas e femininas com animais identificáveis ou imaginários. As composições apresentam uma particularidade: a personagem principal, normalmente em destaque pelo seu posicionamento ou pelo tamanho que ocupa no papel, manifesta uma soberania face à(s) outra(s) personagem(ns) representada(s).

Ana Carrondo

Portugal, 1967

Ana Carrondo, por volta dos dezassete anos, começou a mostrar sinais de instabilidade, razão pela qual foi internada num hospital psiquiátrico. Frequentou o atelier de terapêutica ocupacional no Instituto Condessa de Rilvas, em Lisboa. Participou em diversas exposições com os seus azulejos, que integram coleções privadas e museológicas.

Friedrich Schröder-Sonnenstern

Lituânia, 1892 – Alemanha, 1982

Nascido na Prússia em 1892, Schröder-Sonnenstern viveu uma infância difícil e tudo o que se sabe sobre a sua vida adulta é pautado pela especulação. Consta que viveu sobre o pseudónimo de Dr. Eliot Gnass von Sonnenstern, um médico ostensivamente charlatão que enganou vários pacientes ricos e que partilhou o seu feito com os mais desfavorecidos. Os desenhos enigmáticos e altamente eróticos de Schröder-Sonnenstern foram reconhecidos pelo grupo Surrealista francês que incluíram o trabalho de Sonnenstern nas suas exposições. As suas imagens fantásticas com mulheres voluptuosas e parceiros masculinos carnudos são marcadas por um lirismo paradoxal que parece estar muitas vezes em discordância com a sua pesquisa francamente lasciva. Repleto de demónios, esqueletos e outras figuras ultrajantes, o trabalho de Schröder-Sonnenstern ostenta o carimbo da paródia social.

Gabriel Bien-Aimé

Haiti, 1951

Ex-aluno do escultor Janvier Louis-Juste, é conhecido por ser um dos melhores escultores de metal cortado. Misturando temáticas vudus e cristãs, o seu trabalho distingue-se pelo relevo escultural através de técnicas como a dobragem do ferro e a adição de peças metálicas. Participou na famosa exposição “Les Magiciens de la terre” e tem exposto internacionalmente, nomeadamente no Musée National d’art Moderne de Paris, no Milwaukee Art Museum, no Grand Palais, no Abbaye de Daoulas, na Halle Saint-Pierre, no Fowler Museum, no Musée du Montparnasse e no Queens Museum of Art. As suas obras encontram-se nas coleções permanentes do Centre Pompidou, do Musée du Quai Branly, do Musée National d’art Moderne de Paris, do Waterloo Museum, do Figge Art Museum, do Le Centre d’Art e do Musée d’Art Haïtien du Collège Saint-Pierre.
Le Centre d’Art, Haiti

Giovanni Battista Podestà

Itália, 1895 – 1976

As circunstâncias sociais e políticas da primeira metade do século XX marcaram profundamente a vida e a obra de Giovanni Battista Podestà na medida em que grande parte dos seus trabalhos refletem as incertezas, as inseguranças e as mudanças que definiram esse período. Numa primeira fase, Giovanni Podestà dedicou-se à pintura a óleo, representando, sobretudo, motivos religiosos e paisagens. Mais tarde, começou a criar esculturas em baixo e alto-relevo com recurso a vários materiais recuperados como fragmentos de espelhos, papel ou metal. O trabalho de Podestà é marcado pela simbologia religiosa e popular e pode ser entendido como um manifesto contra a perda de alguns valores espirituais em detrimento de valores materialistas que começaram a surgir associados à sociedade de consumo crescente.

Giovanni Bosco

Itália, 1948–2009

No seu apertado quarto Giovanni Bosco passou horas a pintar um universo gráfico de raro poder em pedaços de cartão, composto por partes do corpo humano, tais como o coração, um braço, uma perna, os pulmões, por vezes acompanhados de estrutura óssea e muscular. São ocasionalmente acompanhados de inscrições nas quais o autor menciona, entre outras coisas, a sua identidade, o seu ano de nascimento, o do seu pai, bem como nomes de cidades italianas ou aldeias sicilianas. Pintava as paredes do seu quarto e as figuras que emergem do seu pincel assumem então dimensões superiores, chegando por vezes a atingir a escala humana. Giovanni Bosco marcou a sua passagem pelas ruas de Castelmezzano del Golfo, onde vivia, com pinturas a óleo nas paredes da vila, apropriando-se assim do espaço público e fugindo das privações e condições em que vivia.

Daniel Gonçalves

Portugal, 1977

Daniel Gonçalves é um desenhador e pintor autodidacta, nascido no Porto em 1977, com uma profunda genuína veia artística. Esta sua qualidade, aliada a uma personalidade hiperactiva, levou-o desde muito novo a entender o mundo e a relacionar-se com este através da expressão plástica, tendo participado na última década em múltiplas exposições colectivas realizadas no Grande Porto. No percurso pleno de experimentações que fez, na procura de uma marca
pessoal, independentemente da multiplicidade de estilos, sempre revelou uma atenção particular pelos jogos de formas e de cores.

Janko Domsic

Croácia, 1915-1983

Pouco se sabe sobre a vida de Janko Domsic ou das circunstâncias da sua chegada a França. Terá passado algum tempo na prisão e, em 1935, trabalhou na construção de uma linha ferroviária. Em Paris, onde vivia em condições precárias, Domsic desenhava e escrevia com lápis de cor, esferográficas e marcadores. Os seus desenhos contêm numerosos textos em francês e alguns em croata e alemão. Com exceção de algumas referências à sua vida pessoal, a canções nazis e a textos religiosos, o seu vocabulário refere-se, essencialmente, a ideias místicas, ao código moral dos maçons e a questões económicas. As suas figuras, alargadas até ao limite em linhas que se unem e formam labirintos, estão ornamentadas com pentagramas, suásticas e hífens.

Marilena Pelosi

Brasil, 1957

Marilena Pelosi nasceu em 1957 no Rio de Janeiro, Brasil. Começou a desenhar com dezasseis anos após sucumbir a uma grave doença. Pelosi era filha única e os pais eram católicos antes de se converterem a um culto vudu. Aos vinte anos, saiu do Brasil para viajar até à Europa e Índia, tendo-se estabelecido em França. Personagens catalépticas, corpos mutilados e penetrados, transportadores sem fim e exércitos de abelhas com cabeças humanas são os seus tópicos mais frequentes. Marilena sente que o seu trabalho se assemelha à criação de espíritas, quer pelo seu misticismo quer pela imprevisibilidade: reivindica que nunca planeia uma criação antecipadamente – são as suas mãos que a guiam. Para Pelosi o prazer de revelar uma cena através da sua imaginação constitui o sentido da vida.

Miroslav Tichý

República Checa, 1926 – 2011

O trabalho de Miroslav Tichý, que foi descoberto em 1989 pelo seu vizinho, o realizador Roman Buxhaum, revela o distinto talento de uma figura que firmemente recusou os valores sociais, políticos e pessoais do período comunista desde o seu início em 1948 até ao seu fim, no final da década de 1980. Tichý iniciou-se na fotografia em meados da década de 1950, reinventando-a e construindo as suas próprias máquinas e ampliadores a partir de caixas de sapatos, latas, vidro reciclado e outros materiais descartados. As suas imagens captadas com máquinas feitas manualmente e com óticas improvisadas, oferecem uma visão extraordinária de uma realidade erotizada, simultaneamente real e onírica. O trabalho de Tichý foi primeiramente mostrado na Bienal de Sevilha em 2004 e, mais tarde, em 2008, numa exposição individual no Centre Pompidou, em Paris.

Última atualização: 21 de Junho, 2022